Bairros inimigos, condomínios populares que se
atacam, brigas de torcidas. Capital líder em homicídios de negros do
país, João Pessoa é uma cidade dividida. No
coração dos conflitos, centrados na periferia, estão grupos que
controlam diferentes áreas da cidade: a "Okaida", nome inspirado na rede
terrorista Al Qaeda, e os "EUA", inimigos da Okaida. Nessa
disputa batizada pelo principal conflito mundial deste século, a
história se resume à luta pelo comando do tráfico ou de presídios, diz a
polícia. Mas moradores da periferia relatam que o problema é mais
profundo e se nutre da rivalidade entre bairros. Sob
ameaça de morte, jovens são proibidos de frequentar espaços visados por
jovens de áreas rivais, ainda que não tenham ligação com o crime.
Pichações das gangues marcam cenas de homicídios. A
briga entre torcidas organizadas também estimula a violência, dizem
moradores. Apesar de torcerem para o mesmo time, o Botafogo-PB, a
Torcida Jovem da Paraíba e a Fúria Independente são de bairros rivais, e
mobilizam centenas de jovens. Para
a polícia, o ódio entre bairros é fomentado por traficantes para forçar
jovens vulneráveis a entrar nas facções. "Perguntamos o por quê do
encantamento com facções e o próprio jovem não sabe dizer", diz Andrezza
Gomes, 22, da Pastoral do Menor.
MORTES DE NEGROS
João
Pessoa registrou 518 mortes violentas em 2012. Para a Polícia Civil,
metade está ligada ao tráfico e à disputa entre os grupos. O
Mapa da Violência 2012, que computa homicídios de 2010 registrados pelo
SUS (Sistema Único de Saúde), mostra que, para cada homicídio de
branco, 29 negros são mortos na cidade. É
a capital com a maior taxa de homicídios de negros do país: 140,7 por
100 mil negros. A taxa nacional é quatro vezes menor, 36. O estudo considera negro a somatória de quem se declara preto e pardo ao IBGE. O
governo do Estado reconhece que os números apontam uma tendência, mas
diz que pode haver diferença entre dados do IBGE, em que o entrevistado
declara sua cor, e os do SUS, em que o médico atesta a cor da vítima. Para o historiador e militante negro Danilo da Silva, a Paraíba vive um "genocídio" da população negra. Não
se trata, porém, de um confronto armado entre raças, mas de
enfrentamento entre os próprios moradores da periferia da capital. Silva
aponta a "omissão do Estado na periferia", que não se empenharia para
resolver os crimes, como o componente que permite essa situação.
"É
como se o envolvimento no tráfico justificasse tudo: morreu, foi coisa
boa. Mas nem todos estão envolvidos." Estudante, pedreiro, capoeirista e
negro, Edjackson da Silva Ferreira, 17, foi morto no último dia 20 no
condomínio onde vivia com a mãe, no bairro do Valentina, um dos mais
violentos da capital. Moradores do
condomínio rival invadiram o local e atiraram em Ferreira apenas para
"não perder a viagem", porque não encontraram seus alvos, dizem pessoas
próximas. "Ele não era do tráfico",
afirma o professor de capoeira João Paulo Pereira, 28. Desde então,
tiros entre os condomínios são quase diários.
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